Meio ambiente

quinta-feira, novembro 03, 2011

Pangola


Callicebus barbarabrownae Hershkovitz, 1990

Provável imagem da espécie
NOME POPULAR: Guigó; Grigó; Guigó-da-caatinga; Sauá; Pangola
SINONÍMIAS: Callicebus personatus barbarabrownae (Hershkovitz, 
1990); Callicebus gigot (Spix, 1823) Hill, 1960
FILO: Chordata
CLASSE: Mammalia
ORDEM: Primates
FAMÍLIA: Pithecidae
STATUS DE AMEAÇA
Brasil (MMA, IN 03/03): Ameaçada
Estados Brasileiros: não consta
CATEGORIAS RECOMENDADAS
Mundial (IUCN, 2007): CR
Brasil (Biodiversitas, 2002): CR – B2ab(i, ii, iii); C2a(i); D

  • INFORMAÇÕES GERAIS

  Callicebus barbarabrownae, como as demais espécies do gênero, é um primata com peso de 1 a 2 kg, extremamente ágil e silencioso quando em deslocamento (von Spix, 1823; Hershkovitz, 1988). Os guigós vivem em grupos que constituem unidades familiares formadas por, no máximo, quatro indivíduos (um casal, um filhote nascido no ano anterior e um filhote recente). Também são encontrados grupos com três indivíduos (quando o filhote maior já dispersou). Os pais compartilham o cuidado parental, sendo o filhote carregado por ambos. Os grupos familiares de um mesmo fragmento florestal cooperam entre si no comportamento agonístico (contra intrusos) mediante vocalizações, o que leva algumas pessoas a pensarem que os grupos são maiores. O guigó-da-caatinga habita as caatingas arbóreas e matas orográficas, formações florestais hoje raras que fazem parte do bioma Caatinga, o mais desconhecido do Brasil. Ocupam as terras altas da Bahia, com altitudes que vão de 241 até 908 m (municípios de Candeal e Gentio do Ouro, respectivamente). Primatas de dieta onívora, alimentam-se de recursos diversos, incluindo frutos, folhas, gomas de árvores, raízes, mel, filhotes de aves, pequenos anfíbios, roedores, piolhos de cobra e outros insetos. São exigentes quanto aos frutos, preferindo os de sabor adocicado aos amargos. Algumas espécies frutíferas por eles utilizadas são o cajá-bravo (Spondias dulcis), o mucugê (Couma rigida), o pau d’óleo (Copaifera langsdorffi), a maçaranduba (Pouteria chrysophylloides), o oiti (Couepia sp.), o licuri (Syagrus coronata), a gameleira (Ficus sp.), a pinha (Rollinia exalbida) e o umbu (Spondias tuberosa). Faltam estudos sobre o tamanho das áreas de uso desta espécie, mas em fragmentos de 30 ha foram encontradas até três unidades familiares (Printes, 2007). Os guigós são popularmente conhecidos por sua vocalização, sendo seu nome onomatopéico. Realizam longos duetos comandados pelo macho, principalmente ao nascer do sol, e muitas pessoas associam sua voz à imagem de outros primatas da Caatinga, como o bugio-preto (Alouatta caraya) ou o macaco-prego-do-peitoamarelo (Cebus xanthosternos). Isso se dá porque os outros primatas são bem mais visíveis do que eles, que costumam se esconder atrás dos troncos ou dentro das copas das árvores. As vocalizações dos guigós têm a função de defender suas famílias e territórios. Outras espécies de primatas que ocorrem em associação com os guigós são os sagüis, que na Bahia são chamados de nicos ou sóins (Callithrix  penicilata e Callithrix jachus). Os guigós são indicadores de matas bem conservadas no bioma Caatinga, ocorrendo também em associação com outras espécies de mamíferos e aves, algumas ameaçadas. Seus predadores são os grandes felinos. Em novembro de 2004, uma onça pintada foi atraída pela execução da voz gravada de um guigó, no município de Queimadas, na Bahia (Printes, 2007). O guigó-da-caatinga é uma espécie que responde prontamente ao ouvir a execução da gravação da voz de outro guigó (da mesma ou até de outra espécie). Essa técnica, conhecida como playback, pode ser utilizada para localizar os grupos nos fragmentos florestais. Entretanto, os animais não respondem ao playback quando estão com filhotes lactantes, o que se dá entre novembro e dezembro (Printes, 2007).

  • DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA

  Dado o atual estágio de devastação da Caatinga, a distribuição original da espécie é de difícil reconstituição. Na região de Vitória da Conquista (BA), a introdução de espécies invasoras de capins e a urbanização desfiguraram a paisagem na transição entre a Mata Atlântica e a Caatinga.  É impossível saber se aquela foi uma área de ocorrência de Callicebus melanochir ou de C. barbarabrownae. Porém, tendo em vista a variação de altitude na região da serra do Marçal, é possível que C. barbarabrownae algum dia tenha tido como limite sul o planalto de Conquista. Abaixo deste, a Mata Atlântica e acima, a Caatinga. A porção mais meridional da Chapada Diamantina (região de Lençóis) provavelmente barrou a distribuição da espécie a oeste, mas a porção mais ao norte (região de Wagner e Utinga) não teve o mesmo efeito. As matas ripárias do rio São Francisco podem ter sido os habitats mais ao norte e oeste da espécie, porém foram substituídas por caatinga arbustiva densa (“carrasco”). O guigó-da-caatinga tem sua distribuição geográfica atual restrita ao território da Bahia, com extensão de ocorrência situada entre cinco paralelos e seis meridianos, totalizando 291.438 km2. O limite norte da distribuição corresponde às serras de Minuim, município de Santa Brígida (09º49’36.18”S; 38º05’44.74”W, alt.: 451 m). O limite sul é a Serra do Sincorá, Fazenda Corcovado, município de Contendas do Sincorá (13º54’52.10”S e 41º10’23.70”W, alt.: 712 m). O limite leste está na divisa entre os Estados da Bahia e Sergipe, no município de Coronel João Sá (10º13’49.80”S e 38º02’0.13”). O limite oeste está a 107 km do rio São Francisco, na localidade conhecida como Salitre, município de Gentio do Ouro (11º32’54.40”S e 42º 22’58.70”W, alt.: 908 m).

  • PRESENÇA EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

  Não existem registros confirmados da espécie em Unidades de Conservação. O guigó-da-caatinga foi registrado numa propriedade confrontante ao PARNA da Chapada Diamantina (BA), próxima à APA Marimbus/Iraquara e à APA Gruta dos Brejões/Vereda do Romão Gramacho (Printes, 2007). 

  • PRINCIPAIS AMEAÇAS

  Ciclos de queimadas e desmatamentos foram e são os principais problemas enfrentados pelo guigó-dacaatinga. Nas localidades de Jeremoabo, Cícero Dantas e Antas, as caatingas arbóreas ainda são substituídas por pastagens. Mais de uma dúzia de espécies de capins foi introduzida na Caatinga desde 1970. Como afirmam Coimbra-Filho & Câmara (1996), a associação entre desmatamento e seca é estreita: a destruição das matas ripárias mudou o regime hídrico dos corpos d’água, que passaram de perenes a sazonais. Hoje, o desmatamento está localizado principalmente em áreas destinadas à reforma agrária. Os grandes latifúndios abrigavam amplas reservas legais, mas, uma vez desapropriados, passam a ser divididos em lotes de 15 ou 20 ha, provocando a fragmentação. Mesmo que cada família cumpra a legislação, a área de reserva legal será pequena, dado o tamanho dos lotes. As queimadas não são uma prática freqüente, porque não há mais o que queimar. Segundo Cunha (1901), o hábito de queimar o mato para produzir novas áreas de roça e pasto foi herdado dos silvícolas pelos colonizadores, daí a palavra “caapuera” (em tupi, “mato extinto”). Segundo o mesmo autor, em 1713 o império já tentava, por meio de decretos, colocar fim às queimadas. Se essas referências parecerem antigas, devemos lembrar que o início da pecuária no Nordeste data de 1559, por iniciativa de Tomé de Souza (Coimbra-Filho & Câmara, 1996). Embora não sejam mais praticadas de forma recorrente, as queimadas já alteraram para sempre os padrões de distribuição de C. barbarabrownae (Hershkovitz, 1990). A urbanização da zona rural dos municípios é outra força poderosa no cenário de extinção do guigó-da-caatinga. Arraiais e vilas surgiram em fazendas, originando distritos de municípios que se emanciparam, principalmente a partir da Constituição Federal de 1988. As emancipações são uma forma de combater o desemprego, já que, normalmente, a prefeitura é o maior empregador do município. O desmatamento está associado à urbanização do solo rural, visando sobretudo suprir a demanda por moradia. Um exemplo é Lamarão, localidade-tipo de C. barbarabrownae, que se emancipou de Serrinha em 1962 e hoje tem cerca de 10.000 habitantes. Apenas em um fragmento de 200 ha foi registrada uma população de guigós naquele município. A caça não é um grande problema para a sobrevivência dos guigós, pois há outros elementos da fauna mais interessantes em termos de proteína, como o veado (Mazama americana), o tatu (Dasypus novemcinctus), o peba (Euphractus sexcinctus), o mocó (Kerodon rupestris) e o zabelê (Crypturellus noctivagus).


  • ESTRATÉGIAS DE CONSERVAÇÃO

1) Esclarecimentos aos sem terra: as lideranças alegam que a maior parte dos danos ambientais se deve ao desconhecimento da legislação e argumentam que têm interesse no assunto. Além do esclarecimento aos agricultores, deve haver um planejamento do desenho dos lotes na planta do terreno, visando manter a conexão entre as áreas de reserva legal. Para tanto, seria necessária uma parceria entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). 2) Financiamento para agricultura familiar e irrigação: muitos sertanejos não sabem fazer rotação de pastagens e calagem de solo, nem têm recursos para isso, o que os leva a derrubar anualmente novas áreas de Caatinga para roçar. Há regiões com lençol freático a menos de 40 m de profundidade, mas falta financiamento para a perfuração. Com irrigação, muitas comunidades poderiam trocar a pecuária pela agricultura familiar. 3) Unidades de Conservação: resolver a situação fundiária e implementar planos de manejo nas Unidades já existentes pode ser mais eficaz do que criar outras, no caso do guigó-da-caatinga. Todas as Unidades de Conservação, estaduais ou federais, próximas à extensão de ocorrência da espécie necessitam de urgente intervenção do Governo do Estado da Bahia e do Governo Federal. São exemplos o Parque Nacional da Chapada Diamantina (com problemas fundiários) e o Parque Estadual das Sete Passagens (sem plano de manejo). É preciso facilitar a criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), tendo em vista o importante papel das áreas particulares para a conservação da fauna brasileira (Diego et al., 1993). Nos locais onde há necessidade de estabelecer novas Unidades de Conservação de domínio público, sugere-se que sejam Unidades de tamanho operacional para a fiscalização e desapropriação, incentivando, simultaneamente, a criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural em seu entorno. Essa estratégia é recomendada para a região de Salitre, município de Gentio do Ouro (BA), onde foram encontradas caatingas 
arbóreas com guigós. 

  • ESPECIALISTAS/NÚCLEOS DE PESQUISA E CONSERVAÇÃO 

  Rodrigo Cambará Printes (UFMG) - Pelo IESB, o pesquisador também desenvolve projeto com a espécie mediante  financiamento do Programa de Proteção às Espécies Ameaçadas de Extinção da Mata Atlântica Brasileira, coordenado em parceria pela Fundação Biodiversitas e CEPAN. Anthony B. Rylands (Conservation International). 


Fonte: Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção


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