quinta-feira, outubro 06, 2011

Sagüi-taquara


Callithrix flaviceps (Thomas, 1903)

NOME POPULAR: Sagüi-da-serra; Sagüi-taquara
SINONÍMIAS: Callithrix jacchus flaviceps
FILO: Chordata
CLASSE: Mammalia
ORDEM: Primates
FAMÍLIA: Callitrichidae
STATUS DE AMEAÇA
Brasil (MMA, IN 03/03): Ameaçada
Estados Brasileiros: MG (EN); ES (EN)
Anexos da CITES: Anexo I
CATEGORIAS RECOMENDADAS
Mundial (IUCN, 2007): EN
Brasil (Biodiversitas, 2002): EN – C2a(i)

  • INFORMAÇÕES GERAIS 

  Callithrix  flaviceps é um sagüi de coloração geral do corpo cinza-acastanhado-claro, com os lados da face castanho-acinzentado-claro. Possui pêlos com faixa basal em tom que vai do cinza escuro ao negro, tornando-se mais claros apicalmente, apresentando pequenas manchas acima dos olhos. Já o dorso possui padrão estriado de coloração, com faixas castanho-escuras alternando-se a faixas cinza claras. A garganta, o peito e o ventre são em tom amarelo-acastanhado-claro, mais ou menos pontilhado de cinza-escuro a negro; membros posteriores e anteriores, como a porção posterior do dorso, sem estrias, pés e mãos amarelo-acastanhados, pontilhados de cinza-escuro. Coimbra-Filho (1990) e Coimbra-Filho & Mittermeier (1973) destacam a raridade natural do táxon e indicam estreita relação filogenética entre C. aurita e C. flaviceps, indicando que ambas podem ser mesmo subespécies. Porém, Mendes (1997a, 1997c) investigou os padrões de vocalização da espécie como parte de um estudo comparativo de sagüis do Sudeste brasileiro e percebeu que C. flaviceps emite vocalização distinta das demais, mas muito semelhante a C. aurita. Da mesma forma, Ferrari & Diego (1993) e Vivo (1991) corroboram a tese de que são espécies válidas. Natori (1994) também aborda a questão taxonômica referente às espécies de Callithrix e destaca ampla variação entre os caracteres craniométricos avaliados, validando os táxons. Estudos sobre a ecologia e o comportamento do sagüi-da-serra foram iniciados por Alves (1986) na Reserva Particular do Patrimônio Natural Feliciano Miguel Abdala (antiga Estação Biológica de Caratinga, em Minas Gerais), seguidos por estudos de ecologia populacional entre 1984 e 1986 (Ferrari, 1991; Ferrari & Diego, 1992) e entre 1996 e 1997 (Guimarães 1998a; 1998b). Na Reserva Particular do Patrimônio Natural Feliciano Miguel Abdala, o tamanho médio dos oito grupos observados por Ferrari (1991) foi de 9,1 indivíduos/grupo, variando de 3 a 16. A área de uso  do grupo de estudo totalizou 35,5 ha e as distâncias diárias percorridas foram, em média, de 1.200 m (Ferrari, 1991). A área de uso do grupo estudado por Ferrari (1991) mostrou não ser exclusiva, sendo que em 87,5% de sua extensão houve sobreposição com áreas de grupos vizinhos. A dieta de C. flavicepsé composta principalmente por presas animais (20% insetos, especialmente da ordem Orthoptera, além de pequenos anfíbios e répteis) e pela goma de oito espécies arbóreas (especialmente Acacia paniculatae Anadenanthera peregrina). Frutos foram consumidos sazonalmente, mas em pequenas quantidades (14% da dieta). A diversidade e a proporção de presas animais na dieta aumentaram durante a estação chuvosa (Ferrari et al., 1996; Corrêa et al., 2000). O consumo de frutos também foi mais evidente durante essa estação (janeiro e fevereiro), sendo o consumo de gomas ligeiramente reduzido. A exemplo de outras espécies do gênero, somente uma fêmea reproduz em cada grupo, com partos gemelares ocorrendo duas vezes por ano (novembro a janeiro e julho a setembro). Como foi apontado por Oliver & Santos (1991), a preferência da espécie por habitats localizados acima de 400-500 m indica que sua distribuição ecológica é ainda menor do que sua distribuição geográfica. As populações hoje conhecidas são escassas, isoladas e de pequeno tamanho. Assim como o sagüi-da-serra-escuro (C. aurita), é provável que  C. flaviceps seja naturalmente mais raro do que as demais espécies do gênero.

  • DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA

Sua distribuição passada deveria ir até a margem sul do rio Doce, em Minas Gerais (Coimbra-Filho et al., 1981), conforme novos registros da espécie na última década (Hirsch et al., 1999; Costa et al., 2003; Tabacow et al., 2005), estendendo-se até a região montanhosa do Espírito Santo (Mendes, 1997b). Ao sul, os limites de distribuição se confundem um pouco com os limites de C. aurita, ocorrendo ampla faixa de hibridação natural em Minas Gerais, perto de Carangola (ao sul) e Caratinga (mais ao norte), próximo ao rio Manhuaçu, divisa com o Espírito Santo, conforme descrito por Mendes (1997b) e Melo (1999). Utilizando técnicas moleculares, Melo (1999b) confirma o padrão genético mesclado, com base em marcadores moleculares Random Amplified Polymorfic DNA (RAPD), de alguns indivíduos considerados híbridos, embora as formas sejam muitas vezes indistintas morfologicamente. A oeste, a distribuição vai até a margem leste do rio Doce, estendendo-se em toda a margem deste rio até próximo de Colatina (ES), onde a espécie é substituída por C. geoffroyi (Hirsch et al., 1999; Tabacow et al., 2005). Mendes (1997b) frisa ainda que C. flaviceps ocorre, no Espírito Santo, além da cota altimétrica de 500 m acima do nível do mar, uma vez que a espécie é gradativamente substituída por C. geoffroyi em altitudes inferiores. Entretanto, C. flaviceps já foi visto próximo à Reserva Biológica Augusto Ruschi, em altitudes inferiores a 400 m acima do nível do mar (S. L. Mendes, com. pess.). Além disso, Hirsch et al. (1999) descrevem novas localidades em que a espécie ocorre em altitudes inferiores a 300 m acima do nível do mar, o que parece indicar que a mesma possui ampla variação altitudinal, como ocorre com C. aurita, demonstrando grande amplitude de ocupação de habitats, a despeito do seu nome vulgar, que é sagüi-da-serra.

  • PRESENÇA EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 

RPPN Feliciano Miguel Abdalla, RPPN Mata do Sossego, PM do Sagüi (Manhumirim), PARNA do Caparaó (registro a ser confirmado) (MG); REBIO Augusto Ruschi, PE de Pedra Azul, PE de Forno Grande, Estação Biológica São Lourenço e Estação Biológica de Santa Lúcia (ES).

  • PRINCIPAIS AMEAÇAS

  Os principais fatores que ameaçam a espécie são a destruição de seu hábitat e seu padrão restrito de distribuição geográfica, pois essa restrição pode torná-la mais susceptível a eventos ambientais e populacionais estocásticos. Com base em uma análise do SIG (Sistema de Informação Geográfica) , Hirsch et al. (1999) ampliaram significativamente a área prevista de ocorrência da espécie, passando de 11,4 mil km2para 28,9 mil km2. Ainda assim, C. flaviceps é uma espécie considerada ameaçada face ao intenso processo de desmatamento sofrido na região do médio rio Doce, em Minas Gerais. Além disso, grande parte das populações remanescentes se encontra reduzida e fragmentada, com poucas chances de sobrevivência em longo prazo. Vários grupos de espécies exóticas têm sido identificados em fragmentos florestais existentes dentro da área de distribuição original para C. flaviceps e, isso possivelmente poderá afetar ainda mais a sobrevivência continuada da espécie em diversos trechos onde ela naturalmente ocorre (Mendes & Melo, 2007).

  • ESTRATÉGIAS DE CONSERVAÇÃO

  É evidente que existe a necessidade de localizar outras populações selvagens da espécie e assegurar a sua proteção em Unidades de Conservação adicionais (Oliver & Santos, 1991). Por outro lado, os estudos de Ferrari & Mendes (1991) e Diego et al. (1993) sugerem que populações de C. flaviceps podem sobreviver em áreas pequenas, assim como em florestas degradadas. Situação bem distinta da encontrada no Espírito Santo, onde há baixa densidade detectada e as populações vivem em grandes fragmentos florestais (Pinto et al., 1993; Passamani et al., 2000). A proteção do sagüi-da-serra em áreas particulares é uma meta que deve ser atingida urgentemente, com o esforço conjunto de entidades conservacionistas e governo, para resguardar o máximo de fragmentos florestais significativos onde a espécie subsiste. É uma estratégia eficiente de conservação que deve vir acompanhada de programas de educação ambiental junto aos proprietários rurais. Deve-se ainda empreender esforços visando implementar projetos de criação em cativeiro, no momento inexistentes. O refinamento das questões taxonômicas também deve ser priorizado, permitindo melhor compreensão do real status desse táxon e das potenciais zonas de hibridação na natureza. As áreas já decretadas como Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPNs – e que abrigam populações da espécie devem prever programas de recuperação de hábitat e formação de corredores, buscando a conexão desses fragmentos, já que a maioria é representada por áreas de médio e pequeno porte.


  • ESPECIALISTAS/NÚCLEOS DE PESQUISA E CONSERVAÇÃO 

  Stephen F. Ferrari (UFPA) conduziu experimentos na RPPN Feliciano Miguel Abdala (antiga Estação Biológica de Caratinga) e auxiliou, junto com Anthony B. Rylands (Conservation International), a conclusão de novos estudos feitos na própria RPPN, no início da década de 1990, com Alice Guimarães. Além disso, Sérgio Lucena Mendes (UFES) conduziu amplo estudo sobre distribuição geográfica e padrão de vocalização entre as espécies de Callithrix e auxiliou nas coletas de amostras de DNA para a conclusão dos estudos de Fabiano Rodrigues de Melo (UFG) sobre zonas de hibridação natural entre C. flaviceps, C. aurita e C. geoffroyi. Fabiano Rodrigues de Melo vem conduzindo levantamentos populacionais visando entender melhor os processos de permanência e extinção de grupos de sagüis-daserra na natureza, nos arredores de Manhuaçu, Simonésia e Manhumirim, municípios mineiros que se encontram no limite sul de distribuição da espécie.


Fonte: Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção

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